terça-feira, 9 de julho de 2024

Retalhos de afeto

Minha mãe era costureira, e com os retalhos que sobravam das costuras ela juntava e fazia uma combinação de cores de retalhos, num maravilhoso quebra cabeças e transformava em colchas de cama. Certo dia, uma senhorinha da minha rua que sempre vinha visitar meus meninos pequenos viu uma dessas colchas na cama do Pedro e pediu pra eu encomendar uma para seu neto que ia nascer. Minha mãe fez, ela presenteou o neto Luiz. Dona Luiza já desencarnou, recentemente a sua casa foi demolida e ninguém fala mais nela.
Esses dias na sala de aula, o Luiz me perguntou se eu conheci a dona Luzia, mãe de Daniela que morava na minha rua. Respondi que sim, ele perguntou se podia me abraçar e me contou a história da sua colcha de retalhos presenteada por sua amada avó, a colcha que tem uma memória afetiva muito importante na vida dele e que foi o melhor presente. Sua avó contou que quem havia costurado era a mãe da vizinha dela (no caso eu) que agora era sua professora. 
No caminho para casa fiquei a pensar também na minha única boneca de pano feita com retalhos por tia Aiá, como ela foi importante na minha infância! E embora não tenha fotografias, tenho suas feições guardadas na minha canstra de lembranças que as vezes me tira risos no meio de pensamentos distantes. Tenho ainda uma blusa de retalhos de ceda que mãe costurou, e quando faço arrumação não tenho coragem de desafazer dela, a combinação de cores e estampas é tão perfeita, e assim, ela vai ficando. Tenho lindos retalhos de lembranças de quando a roda da máquina virava direção de carro, de quantas vezes furei o dedo tentando costurar, ou mesmo colocando linha na agulha, das tardes costurando panos de pratos juntas e conversando sobre qualquer coisa.
Fiquei pensando então nas palavras do Gandhi quando afirmou: " Você nunca sabe que resultados virão da sua ação, mas se você não fizer nada, não existirão resultados".  Minha mãe costurou com esmero uma colcha que sabia que seria presente de uma avó para um neto e a fez com carinho, o resultado de suas ações que ocorreram a quase duas décadas, agora chega até mim como um abraço cheio de histórias afetivas de uma avó com um neto. E nas voltas que o mundo dá, os retalhos de costura bem arrumado juntado pedacinho por pedacinho se tornaram os retalhos de afeto que nunca serão levadas pelo tempo. E as ações de mãe chegaram a mim em forma de abraço de gratidão. E a pergunta que fica é: suas ações sempre voltam pra você ou pra alguém próximo, isso te assusta ou te conforta?

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